por Isabel Fomm de Vasconcellos Caetano
publicado na Revista UpPharma

Muito pouco benefício haverá em esforçar-se por comer corretamente, em esforçar-se por estar em dia com a atividade física, em fazer todos os exames médico-laboratoriais indicados para a prevenção de inúmeras doenças, se não houver alegria de viver.
Os grandes vilões causadores de doenças estão sempre por perto. Ou é o estresse, ou é a infelicidade, em seus diferentes graus, da simples tristeza à depressão.
Sem alegria não existe saúde, como queria o nosso sábio reumatologista, o Dr. José Knoplich.
Cada vez mais a Medicina enxerga a verdade na Psicossomática. Dr. José Carlos Riechelmann é um dos mestres no assunto e explica, cientificamente a correlação entre as nossas emoções e o trânsito químico-hormonal que comanda a nossa saúde, da adrenalina aos neurotransmissores do bem estar.
A vida é, sem dúvida, uma corrida de obstáculos. Há muitas e muitas situações em que são inevitáveis a tristeza, a frustração, o estresse.
Porém existe uma grande diferença na maneira em que se pode reagir às pedras do caminho. Há quem se desespere. Há quem veja na adversidade apenas a chance de superação e auto aperfeiçoamento.
Para a saúde feminina, no entanto, essa condição do binômio saúde-alegria é mais complicada.
As mulheres enfrentam maiores obstáculos, na sociedade, do que os homens. Ainda encaram a famigerada dupla jornada de trabalho, ainda carregam as “culpas” familiares quando algo não vai bem na vida doméstica, desde a limpeza até os comportamentos eventualmente indesejados de sua prole.
Na vida profissional, são muitas vezes preteridas nas promoções, ganham 30% a menos que os homens, em média, exercendo as mesmas funções que eles e ainda são consideradas emotivas, pouco racionais, e sofrem com todas essas ideias preconcebidas que grassaram por séculos em nosso meio, sobre a sua capacidade intelectual e profissional.
Além de tudo isso, 25% das brasileiras são vítimas de violência doméstica. Segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2019, no ano passado, 1206 mulheres morreram por feminicídio e nesse mesmo ano aconteceram cerca de 66 mil casos de violência sexual, sendo que 54% das vitimas tinham até 13 anos de idade. Um estudo da OMS – Organização Mundial da Saúde – afirma que entre 1980 e 2013, “106.093 pessoas morreram apenas por sua condição de mulher”, no Brasil.
Enquanto isso, a sociedade continua acreditando em mitos como a indiscutível alegria de ser mãe e rainha do lar.
O dia Internacional da Mulher ganhou a cara do Dia das Mães misturado com o Dia da Secretária, um dia de comemoração e exaltação da mulher, esvaziando assim o seu real sentido que é o de luta feminista, social, econômica e política.
A saúde feminina, se de fato a saúde anda de mãos dadas com a alegria, dessa forma, vai de mal a pior.
Ainda hoje, as meninas têm menos oportunidades de estudo e de formação profissional do que os meninos, não só entre as famílias, mas também na sociedade como um todo.
Desvalorizadas, confundidas, menosprezadas, apesar de toda essa condição socialmente desfavorável, muitas mulheres ainda se recusam a enxergar a sua verdadeira posição no mundo e negam a luta de suas antepassadas sufragistas e feministas sem as quais, até hoje, ainda estariam sem direito algum.
Foram as mulheres organizadas que conquistaram o direito de votar, o direito à propriedade e à conta bancária (até os anos 1960, mulheres não tinham conta em banco e tudo o que possuíam, antes de casarem-se, passava para seus maridos, podendo estes dispor de seus bens como quisessem), o direito à educação e à carreira profissional.
Foram as mulheres organizadas, repito, que conquistaram os direitos que as brasileiras têm hoje em dia. Nenhum homem deu a elas esses direitos.
Mesmo assim, muitas mulheres ainda acreditam que serão nada, socialmente, sem um homem ao seu lado. Muitas ainda votam no candidato do marido, do chefe, do padre. Muitas ainda não confiam em outras profissionais mulheres, sejam estas médicas, advogadas ou políticas. A maioria das políticas eleitas no Brasil o foram pelo voto masculino, não pelo feminino.
E, ainda, para completar, muitas não conquistaram a verdadeira liberdade sexual, a liberdade de sentir prazer, de ser feliz na cama, num mundo em que prazer é privilégio masculino.
Por isso, meninas, ouso dizer que pouco benefício trará o não-fumar, o alimentar-se corretamente, o malhar loucamente na academia, os exames médicos regulares, a prevenção... Pouco benefício tudo isso trará à saúde feminina se não vier somado à autoestima, ao amor e ao respeito a si própria. Sem a “self” valorização não se alcançará a alegria. E não existe saúde no corpo que não vive a alegria.
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