por Isabel Fomm de Vasconcellos Caetano

Estive pensando que o George Martin tem razão, que vivemos no inferno literal. Se pensamos no mundo em guerra, constatamos, como dizia o saudoso Gaiarsa, que nunca houve um dia sem guerra em algum lugar do planeta.
Mas nem é preciso pensar na guerra ou no inferno literalmente. Tantas e tantas pessoas, nesse momento, nessa cidade, em seu trabalho ou em sua família, estão vivendo um inferno ou estão em guerra.
De repente me lembrei do índio americano dizendo ao neto que trazemos dentro de nós dois lobos que estão sempre em luta. Um é o lobo do mal, da inveja, do egocentrismo, da intolerância. O outro é do bem, da solidariedade, do carinho, do amor. “Mas qual deles vence?” – perguntou o pequeno índio. “Vence aquele que você alimenta” – foi a resposta.
O mundo de Game of Thrones de George Martin é de fato o inferno. É o mundo da política, da intriga, da conspiração, da traição, da ausência absoluta de amor e de solidariedade. É o inferno. É um mundo fascinante, pela aventura. Mas não é, nunca foi, nunca será o mundo que alimento. Somos nós enfim, que escolhemos. Ou vivemos no inferno ou vivemos no paraíso.
Muita gente diz que é da paz. Mas, sem perceber, trabalha para a guerra. Todos nós, vira e mexe, às vezes com a melhor das intenções, trabalhamos para a guerra. Por isso é preciso estar sempre atento às nossas escolhas, ao que dizemos e ao que fazemos.
1. Trabalhamos para a guerra quando, por nossa condição social, diploma, grupo ou clube, agremiação ou Igreja a que pertencemos, nos julgamos superior aos outros.
2. Quando desrespeitamos a privacidade de qualquer outro, ainda que seja nosso cônjuge ou filho, e mexemos nas coisas dele, lemos os emails dele, as mensagens de texto, os inbox... enfim... o que for. Ou seja: trabalhamos para a guerra quando somos covardes o bastante para tentar descobrir a verdade do outro violando a sua privacidade. Gente corajosa, quando quer saber alguma coisa, pergunta. Na lata.
3. Trabalhamos para a guerra quando julgamos que a intimidade nos dá o direito de invadir a privacidade do outro. Quando precisamos de detetives pra descobrir traições é porque não estamos prestando atenção a nada no outro. Nos ligamos tanto nas telas que desaprendemos a linguagem dos corpos. Nenhuma relação sadia é construída na desconfiança. Na desconfiança, trabalhamos para a guerra.
4. Quando acreditamos que a nossa verdade é a única e a verdade do outro é apenas um engano. Quem é da paz sabe que o mundo é feito de verdades transitórias e todas as verdades podem ser consideradas, discutidas e até negociadas.
5. Quando somos incapazes de perdoar. (Todo mundo pisa na bola, incluindo nós mesmos)
5. Quando os nossos preconceitos se colocam acima das evidências científicas. Por exemplo: Homossexualidade não é doença, diz a OMS, e nem opção: é condição.
6. Quando acreditamos a que a nossa família é um grupo especial de pessoas (Por qualquer razão)
7. Quando queremos levar vantagem em tudo.
8. Quando colocamos nossos interesses pessoais acima dos interesses da coletividade.
9. Quando confundimos competição com batalha de guerra, como acontece frequentemente nas empresas e nos campos de futebol. Ah, sim, e também nas novelas de TV. Ou, em outras palavras, quando confundimos adversário com inimigo, como acontece quase sempre na política.
10. Quando nos omitimos na educação das crianças.
Hoje existe uma tendência a acreditar que as crianças são maravilhosas e que reprimi-las é um erro. As crianças são seres humanos em estado bruto. Se não forem lapidadas permanecerão para sempre com aquelas tendências guerreiras e intolerantes com que todos nós nascemos. As crianças são bichinhos cruéis, que zombam umas das outras, que fazem brincadeira maldosas, que machucam bichos e plantas sem pensar, apenas por instinto.
Eduquemos nossas crianças para a paz.
Mas antes disso, precisamos educar a nós mesmos, todos os dias da nossa vida.
Ou será melhor continuar vivendo em guerra?
2017, janeiro, 17
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