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Diná e a Arte Viva

Foto do escritor: SAUDE&LIVROS FommSAUDE&LIVROS Fomm

por Isabel Fomm de Vasconcellos Caetano


Diná Lopes Coelho (1912-2003) retratada por Darcy Penteado, em 1961
Diná Lopes Coelho (1912-2003) retratada por Darcy Penteado, em 1961

O verdadeiro nome dela era Maria Ricardina.


Foi casada com o jurista Canuto Mendes de Almeida mas deixou-o para viver com aquele que ela dizia ser o grande amor de sua vida: o escritor Luis Lopes Coelho. Desquite, separação, ainda eram um certo escândalo nessa época. Mas Diná não se importou.


Na década de 1950, quando Ciccilo Matarazzo fundou no Brasil a Bienal das Artes, Diná tornou-se seu braço direito, organizando essa grande exposição internacional de arte. No pavilhão da Bienal ela podia ser vista circulando de patins, para facilitar a locomoção. Algo absolutamente insólito, para a época! Hoje, vendedoras de grandes magazines circulam de patins pelas lojas... Mas Diná sempre foi dessas fulanas que vivem à frente de seu próprio Tempo.


Ela tornou-se uma figura super importante no mundo das artes plásticas e, em 1969, criou no Museu de Arte Moderna de São Paulo, o Panorama, uma exposição que reunia anualmente o que o Brasil tinha de melhor em artes plásticas. Um ano, pintura. No outro ano, gravura. No outro, escultura e objeto. Assim, foi ela a responsável pela projeção e fama de inúmeros artistas brasileiros que, sem os "Panoramas" talvez jamais tivessem suas obras vindo a público.


Diná nos deixou no começo de 2003. Mas estará para sempre ligada ao desenvolvimento das artes plásticas no Brasil.


Tive o enorme privilégio de conhecê-la, em 1978, quando arrumei um emprego no Museu de Arte Moderna. Diná era minha chefe mas, com o tempo fomos ficando amigas. Ela tinha a idade da minha mãe, 39 anos mais velha do que eu. Mas a sua cabeça era talvez até mais moderna do que a minha... Diná foi uma das (pouquíssimas) grandes amigas que eu tive nessa vida e, até hoje, me vêm lágrimas aos olhos, lágrimas de saudade, quando eu falo nela. Em sua cobertura do Edifício Santa Isabel, na Avenida São Luiz, centro da cidade, as paredes eram tomadas por obras de arte de consagrados artistas brasileiros. Com ela, aprendi muito. Sobre arte e sobre a vida.


Jamais pude esquecer o "livrinho de lembranças" onde ela colecionara mensagens, escritas de próprio punho, para ela, por alguns de seus amigos. Quem eram? De Di Cavalcanti a Érico Veríssimo. De Getúlio Vargas a Juscelino Kubstichek. Fiquei tão fascinada quando vi o tal caderninho de capa dura que ela exclamou: -- "Bel, vou deixar esse livrinho para você, em testamento". Mas não deixou. Anos depois de sua morte eu o vi, de novo, numa vitrine e à venda, num Memorial que suas netas (filhas de seu único filho, Carlos) montaram, com as inúmeras coisas dela -- de obras de arte a objetos pessoais -- numa esquina da Av. República do Líbano.


Diná era boêmia. E eu, naqueles anos 1980, também. Nosso expediente no Museu er das 13h00 às 20h00. Depois disso, tomávamos o primeiro drink no bar do MAM (que hoje se transformou numa muito feia lanchonete, mas que, naquele tempo, era um magnífico bar com paredes em lambri e um mural de Carlos Paez Vilaró e com um grande barman, o Tavares). Depois ela dispensava seu chofer, o Quirino, e o seu elegante Dodge Dart, e saía sentadinha no banco carona do meu humilde fuskinha bege (o Minduim). Passávamos noites e noites em restaurantes e boites de S.Paulo, tomando vinho (ela tomava Macul) e conversando sobre a vida. Na noite, ela me apresentava a todos os solteiros importantes da cidade, na esperança de que algum deles se interessasse por mim. Mas, quando conheci o meu grande amor, Mauro Caetano, em 1983, ela começou a se afastar de mim. Discretamente. Sem alarde.


No fim dos anos oitenta ela decidiu que não queria mais me ver. Disse-me, por telefone, que estava velha demais e que queria que eu guardasse dela a lembrança que eu tinha então.


Respeitei o seu desejo e nunca mais a vi. Mas, se fosse hoje, eu não faria isso. Eu teria ido vê-la, mesmo que ela não me recebesse.


Aprendi muito com ela. Era uma mulher admirável, inesquecível. Um dia, numa exposição no MAM, meu pai a conheceu. E me disse, sobre ela: "É uma Rainha!".


Sim, uma abelha rainha, a minha querida Diná!

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