O Terceiro Incluído da Páscoa

por Dr. José Reynaldo Walther de Almeida

Tarsila do Amaral, 1928, O Ovo

A Páscoa revela o mistério de um novo começo nascido do próprio fim.

Na Álgebra de Lupasco, cada verdade carrega em si sua negação. Entre as duas pulsa um “terceiro incluído”, onde contrários coexistem sem se anular. Basarab Nicolescu vê aí a Santíssima Trindade: não três entidades separadas, mas um único movimento em que unidade e diversidade fluem juntas. A ressurreição é o instante exato em que vida e morte se encontram — coexistindo num mesmo ato.

O ovo de Páscoa, frágil invólucro de promessas, encarna esse princípio. Toque-o com delicadeza: escute o eco quase imperceptível que anuncia uma vida adormecida. Nele, o que já é e o que ainda não é habitam lado a lado, como num cérebro em estado crítico, em que excitação e inibição se equilibram para gerar saltos criativos. Segurá‑lo é sentir na ponta dos dedos a metáfora de um córtex pronto para organizar novas histórias.

No drama da Paixão, Cristo atravessa a dor sem dissolvê‑la.

Em nosso cérebro, situações extremas ativam o eixo hipotálamo‑hipófise‑adrenal (HPA) — responsável pela liberação de hormônios do estresse — e também desencadeiam a produção de neurotrofinas, moléculas que renovam conexões sinápticas.

A queda prepara a ascensão: assim como o grão se parte para germinar, cada sinapse encontra no processo de reparo um caminho para se reinventar.

Quando famílias se reúnem em torno do pão ou do chocolate, algo invisível acontece. O calor suave do ovo em suas mãos traz à tona lembranças do convívio infantil e ativa regiões límbicas ligadas ao pertencimento. Rituais coletivos alinham batimentos cardíacos, sincronizam nossas ondas cerebrais e liberam ocitocina, fortalecendo laços de empatia. A esperança de renovação acende o núcleo accumbens, presenteando‑nos com um impulso dopaminérgico de alegria antecipada.

Lembre‑se de um momento em que, após uma grande dificuldade, você descobriu uma força interior inesperada. Esse é o convite pascal: habitar o espaço entre extremos, onde medo e coragem, dúvida e fé se entrelaçam. Pegue um ovo neste domingo e sinta seu peso discreto, seu silêncio tenso. Nele, como em nossos próprios cérebros, opostos coexistem — criando o solo fértil para um verdadeiro renascimento.

Que este título nos acompanhe até o fim: O Terceiro Incluído da Páscoa. Pois é nele que a vida, em sua potência criativa, emerge dentro de nossas próprias contradições.

Zé Reynaldo, 2025, abril, 18