Aqui, Ainda Mora Essa Criança

por Isabel Fomm de Vasconcellos Caetano

Sou eu, essa menina. Sete décadas depois.

A Terra deu setenta voltas ao redor do Sol, desde que meu pai, Alfredo Fomm, tirou essa foto de mim, na chácara dos meus tios, Augusto e Bebé. Mas serei realmente eu, aí retratada? Se é fato que as células do nosso corpo se renovam totalmente a cada sete anos, hoje o meu físico está há 10 transformações de distância dessa pequena bailarina!Ah... a vida!

A Vida é esse Grande Mistério! Poderia ficar aqui falando de tudo -- e quanto! -- que vivi nesses longos anos dessa minha vida. Tenho 74, agora. Mas já tive 4, 14, 24, 34, 44, 54, 64...

E a vida me brindou com tantos privilégios, gente! Inclusive o maior deles: o de viver um grande amor por looongos e felizes 38 anos!

Nasci amada, num lar cheio de amor e de alegria, fruto de pais que se amavam de verdade e isso é que dá segurança às crianças! É verdade que, durante a ditadura militar brasileira (que durou dos meus 13 aos 34 anos de idade) vivi muitas angústias, nem quero contar, apesar dos meus privilégios.

Só queria escrever. E escrevia, na redação do jornal, com o censor debruçado sobre a minha máquina... Escrevia na praia da represa do Guarapiranga, no meu clube, o Castelo... Escrevi -- e ainda estou escrevendo agora -- por toda a minha vida, mesmo antes de ser alfabetizada. Criança, inventava histórias e as contava à minha avó Amélia...

Escrever me faz feliz!

Minha maravilhosa amiga, Roseli Zampirolli, me deu um poster: "Escrever é desatar um novelo em nós" -- só pode ser obra de um grande poeta!Essa menina, travestida em bailarina, mora ainda dentro de mim, por mais distante que o corpo dela esteja agora do meu próprio corpo.

Feliz 12 de Outubro para todos nós! Que nesse Dia da Criança, consigamos resgatar o pequenino ser que fomos um dia, cruéis muitas vezes, mas virgens das grandes dores do mundo!

Bel, 2025, outubro, 8