Asas de Borboleta
- SAUDE&LIVROS Fomm
- 23 de mai.
- 2 min de leitura
por Isabel Fomm de Vasconcellos Caetano

De repente, apareceu no meu dia, uma borboleta-- disse o Homem — uma borboletazinha de três cores, chatinha, voando sempre em torno de mim. E tanto voou e voou e aparecia nas horas mais impossíveis, no meio de uma reunião, na sala de jantar, dentro do meu carro...E tanto voou que acabei aprendendo a conversar com ela. Percebo as linhas aéreas que traça em seu voo. Entende-lhe os sinais, vejo se confundirem as cores, as tímidas três cores, quando ela rodopia.
E ela me conta histórias de mim, que eu já esquecera, por cansaço ou teimosia.
Ela é uma bruxa.
E eu a amo.
Trouxe pólens de flores da memória, depositou-os em minha pele e fui fecundado pela magia dos pensamentos.
O mundo comum ficou chocho. E me senti muito velho, apenas um homem e um remo, no barco, num lago, dentro de um jardim. Velho.
Foi assim que eu percebi que estava amando aquela borboleta, que ela fazia parte do meu dia. Agora sou jovem de novo. E hei de descobrir a fórmula de transformar a borboleta em bruxa de verdade, em ser humano.
Enquanto leio antigas obras de ocultismo, magia Negra e pesquiso no Google de Walt Disney aos trobriandeses, ela voa ao meu lado, gozadora, esperando... O que?
Que eu a desencante com um beijo? Ora, se ela fosse uma rã já seria difícil. Agora, me diga, amigo, como é que se faz pra beijar borboletas? Ainda mais borboletas loucas, doidinhas, borboletas rodopiantes, saltitantes?
Ela está aqui a meu lado agora. Sim, eu sei que você não a vê, que você não consegue vê-la. É outra de suas bruxices (ela não faz bruxarias, só bruxices) torna-se invisível para fazer com que as pessoas me julguem louco.
Porém, — isso foi uma das coisas que ela me ensinou— não me importo mais o que pensem de mim.
Preciso apenas descobri-la, em sua forma humana, pra ser jovem de novo, e viver, então, 120 anos...
Ah, talvez ela não fique mais comigo, não importa. Aí, já não lhe sentirei a falta. Vai ver, acha outro cara pra bruxulear. Não, eu não vou ficar com ciúmes. Afinal, é apenas uma borboleta.
E, depois de dizer tudo isso, o Homem saiu e se foi, perguntando a todo mundo, se alguém ouvira alguma lenda, alguma história parecida com aquele conto de fadas em que o sapo vira príncipe, alguma história de borboleta de três cores que virasse bruxa.
Mas essa história tem happy end. Ele encontrou a fórmula.
Eu o vi, dia desses, num engarrafamento de trânsito. Estava muito bem, sorrindo, ao lado de uma moça de olhos amendoados, um vestido de três cores e a sombra de umas asinhas, apenas insinuadas, quase invisíveis aos olhos.
Agora sou eu quem anda por ai, olhando ao redor, atento ao menor sinal, ao menor indício de um bater de asas de borboleta.
Bel, 1982 e 2025
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